MOLEIRINHA
quarta-feira, outubro 08, 2003
  ÁFRICA MINHA
Hoje, ficámos a saber que o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) vai instaurar processos disciplinares aos 3 funcionários seus envolvidos no resgate de animais selvagens em cativeiro no Açores, que culminou na morte de duas leoas e um tigre.

Sem a assistência do veterinário que deveria ter acompanhado a operação nos Açores, os funcionários do ICN administraram de forma amadora e negligente calmantes aos felinos que acabaram por sucumbir em tremenda agonia.

Vi as imagens transmitidas pela RTP que mostram a operação de resgate passo-a-passo, e foi revoltante assistir às mortes dos três felinos perante a desconcertante incapacidade para lidar com os problemas demonstrada pelos funcionários do ICN.

A este incidente sobreviveram 3 felinos que foram entretanto encaminhados para o Jardim Zoológico da Maia, onde estão aparentemente bem.

A última vez que vi leões, foi em África, mais concretamente num safari que fiz no Quénia em 1999.

Curiosamente, na minha primeira recordação de África envolve também animais. Desde criança que a minha mãe me conta esta história. Na década de 30, os meus avós maternos pegaram nas malas e partiram do Algarve, atrás do sonho africano. Os meus avós tinham já uma vida próspera em África, rodeados dos seus três filhos, dois rapazes e uma rapariga, quando nasceu o benjamim da família: no dia em que, a milhares de quilómetros de distância, a Alemanha nazi invadia a Polónia, nascia a minha mãe, em Lourenço Marques (actual Maputo).

Numa ocasião, um dos criados dos meus avós desapareceu. Foi, mais tarde, encontrado quase inteiro dentro de um crocodilo, tendo sido identificado por um objecto pessoal que levava consigo.

Também o meu avô sofreu por se ter descuidado na selva, quando foi mordido por uma cobra. Veio a morrer mais tarde como consequência de febres muito elevadas, comuns naquelas paragens e naqueles tempos. Ainda hoje se pensa que o incidente com a cobra pode ter causado uma debilitação que fez com que as febres tivessem tido consequências fatais.

Com a morte do meu avô, o sonho africano acabou. A minha avó, viúva, regressa à metrópole com os quatros filhos. A minha mãe, então com 3 anos, nunca mais regressou a África.

Apesar deste episódio trágico ilustrar de forma dramática a perigosidade dos animais selvagens, a verdade é que a minha experiência pessoal em África é bem diferente. Ao contrário do que muitos possam pensar, qualquer sensação de medo desaparece ao fim dos primeiros minutos de contacto com os animais: assisti, a menos de 2 metros de distância, a uma família de leões a comer uma zebra. Noutra ocasião, uma chita sentou-se no capô do nosso jipe. Ainda hoje, a minha câmara de filmar tem vestígios da lama que nunca consegui limpar, consequência de uma queda que dei na margem de um rio, onde fiquei, por segundos, demasiado próximo de um crocodilo.

As memórias dessa viagem são tão profundas e vibrantes que gostaria de regressar a África com os meus filhos num futuro que espero não seja muito longínquo. Seria bom se a minha mãe nos pudesse acompanhar...
 
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